domingo, 3 de julho de 2016

Precisamos falar sobre a metodologia de ensino (postagem comemorativa)

We don't need no education
We don't need no thought control
No dark sarcasm in the classroom
Teachers, leave them kids alone
Hey! Teacher! Leave them kids alone!
Pink Floyd (Another Brick In The Wall, Pt. 2)


Tétis mergulhando Aquiles no rio Estige.
Imagem: http://uzima-genaye.blogspot.com.br
Os nascidos na década de 80 até meados dos anos 90, conhecidos como geração Y, a exemplo do mito de Aquiles, foram banhados num novo rio Estige, com um leito repleto de informação e tecnologia, salvo os calcanhares que permaneceram intactos às suas águas. Essa fraqueza se reside no excesso de informação, pois essa geração tem interesse em saber sobre tudo. E é essa mesma ânsia de informação que conduz a uma exaustão mental, tão comum no atual século, acompanhada de um estresse geral, silencioso e extremamente perigoso.

Não é incomum escutarmos frases do tipo “tenho a impressão que sei muito menos agora do que quando entrei na faculdade”. Para Sócrates, o autor da célebre frase “só sei que nada sei”, ao reconhecermos que não sabemos tudo, somos capazes de mostrar que nossa sabedoria tem passado por um processo evolutivo. Poucos conhecem o restante da frase de Sócrates, ficando retidos apenas ao seu trecho inicial. Seu pensamento completo nos oferece muito mais reflexão: 

“Só sei que nada sei... e o fato de saber alguma coisa me coloca em vantagem sobre aqueles que acham que sabem, quando na verdade não sabem.”

Em um mundo onde as informações não ficam mais retidas ao professor, aulas expositivas, textos escolares e provas estão se tornando opções cada vez mais monótonas para o aluno, porque este, em meio à era digital, se tornou detentor do conhecimento tanto quanto o professor. O que falta, entretanto, é guiá-lo, despertar sua curiosidade e tornar esse conhecimento prático, belo e útil. Em sala de aula, os títulos acadêmicos e diplomas se tornam meras ferramentas de status se a didática deixar a desejar. Restringir o método de ensino a apenas uma forma entediante de aprender, por meio de quadro e giz, não desenvolve pensamento crítico. Muitos sequer sabem formar opiniões, uma vez que a capacidade de questionar, tão importante para defendermos nosso ponto de vista, foi atrofiada ao longo de toda uma vida pautada pela repreensão dos questionamentos. Alunos não podem ser podados em suas capacidades inventivas, pelo contrário, devem ser incentivados.

A vida acadêmica marcada pelo egocentrismo, sem vista a um conhecimento que promova a coletividade, é extremamente limitadora do pensamento criativo e acaba por formar mentes quadradas em um espaço onde deveriam ser permitidas formas mais variadas possíveis. O aumento do acesso às universidades tem levado a um processo de “deselitização” do ambiente acadêmico e é natural e sadio que pessoas proponham debates para a igualdade de todos os indivíduos num espaço que ainda se mostra tão desigual.

Talvez não haja maior verdade no mundo do que aquela escondida no ditado de que “ler é o melhor remédio”. É muito frequente os relatos na literatura de autores que condenam a poda da criatividade pelo ensino. Em “O Pequeno Príncipe”, por exemplo, atire a primeira pedra aquele que não viu senão um chapéu, quando na verdade era uma jiboia digerindo um elefante. Este é o teste primordial capaz de nos informar o quanto nossa capacidade inventiva tem estado adormecida.

O mantra de nossa metodologia de ensino, ainda baseada em séculos passados, nos diz que devemos ficar presos ao que deve ser aprendido para sermos aprovados. Mais uma vez restringimos em muito o nosso conhecimento do mundo, tão importante quanto o dos livros. Estamos formando cada vez mais especialistas que não se aventuram por outras áreas. E essa formação de especialistas não é mérito apenas do mundo acadêmico. Temos pessoas que se dizem especialistas em praticamente todos os setores. Basta que tenhamos uma conversa no dia a dia e seremos capazes de perceber o quão grande é o número de especialistas em política.

O conhecimento se ramificou de tal forma que perdemos a capacidade de transitarmos pelas diversas vertentes do saber e de promovermos a chamada interdisciplinaridade de conteúdo. A exemplo das ciências exatas e humanas, tão importantes umas às outras, mas que se veem como áreas distintas, tomadas como água e óleo. Explicar matemática, por exemplo, pode ser divertido e extremamente curioso quando contamos a história do surgimento dos números na Índia Antiga, mesclando áreas que até então se mostravam isoladas e fora de contexto.

A Escola de Atenas (Platão e Aristóteles).
Imagem: http://lounge.obviousmag.org
Se voltarmos no passado e avaliarmos a vida de alguns estudiosos e pensadores, veremos que muitos deles tiveram suas vidas marcadas pelo questionamento das coisas e vontade de entender o funcionamento da natureza estando, de fato, inseridos nela. A título de exemplo, Aristóteles ensinava seus discípulos passeando ao ar livre, um método da chamada Escola Peripatética.

Para Descartes, o pai da Geometria Analítica, tão logo a idade lhe permitiu ele abandonou inteiramente o mundo acadêmico e passou a buscar a ciência que se achava nele ou no “grande livro do mundo”. Sua conclusão não pôde ser melhor: pareceu-lhe que poderia encontrar muito mais verdade nos raciocínios das pessoas comuns, do que naqueles feitos pelos homens letrados em seus gabinetes, sobre especulações que não produzem qualquer efeito e não têm outra consequência a não ser aumentar-lhes cada vez mais a vaidade.

A famosa letra da segunda parte da música de Pink Floyd, Another Brick in the Wall (onde o trecho aparece no início deste texto), mostra-se mais atual do que nunca. Da forma como o ensino está, não precisamos de nenhuma educação, muito menos de controle mental.

Gostar do que faz – e de para quem faz – é um dos caminhos para a felicidade. Embora para Freud, pai da psicanálise, o programa de ser feliz seja irrealizável, devemos nos esforçar ao máximo para tornar a sua realização o menos distante possível. A atividade profissional pode nos trazer satisfação desde que seja escolhida livremente. No entanto, o trabalho não é visto como caminho para a felicidade, pois muitas pessoas se dedicam a ele apenas pelo critério da necessidade, não identificando seus anseios e metas à função que desempenham. Para ser professor é preciso, antes de tudo, gostar de ser professor.